quinta-feira, 8 de setembro de 2016

CARTA ABERTA AO EXMO. SR. MINISTRO DA EDUCAÇÃO



Não frequentei Cambridge nem sequer tenho um  cargo importante na sociedade, mas sou mãe e cidadã atenta ao meu país. Quando mudam os governos, criamos sempre expectativas de que tudo vai melhorar. Mas o que realmente acaba por acontecer, é que, quem vem a seguir, tenta desfazer tudo o que o anterior fez, sem questionar se é esse o melhor caminho. E isso, sr. Ministro, preocupa-me.

Tenho filhos a crescer que serão um dia cidadãos deste país que teima andar á deriva. E folgo muito em saber que quer mudar radicalmente o que vai mal na educação. Porque na verdade, tem muito trabalho pela frente. O que eu não entendo, é porque resolveu começar pelo fim. Porque é assim tão urgente mudar os exames. Que importância tem, serem no 4º ano ou no 2º ano, serem de aferição ou não? Que vai isso melhorar no desempenho dos alunos? Que vai isso contribuir para uma melhor aprendizagem? Quer uma opinião de uma simples cidadã que estudou parte da sua vida noutro país e conhece outra realidade? Não comece por aí.

Porque uma casa não se começa pelo telhado. E para obter bons resultados na aprendizagem dos alunos, comece por dar condições de trabalho aos nossos professores. Acabe de vez com esta tortura eterna que os obriga todos os anos a concorrer. Que os obriga a acumular 15 anos às vezes mais, de serviço, para continuarem contratados, anos após anos. Acabe de vez com colocações a 200 km de casa. Acabe de vez com a insegurança de não saberem a cada ano se vão ter trabalho ou não, porque não efectivam. Porque ninguém consegue dar o melhor de si quando trabalha na precariedade. E um professor, como qualquer outro profissional, quer-se motivado e  feliz no trabalho, para desenvolver um ensino de qualidade. Depois não se esqueça de criar incentivos para darem ainda mais de si. Prémios aos melhores, desde salariais a outros tipos de compensações. Quem trabalha gosta de ver seu trabalho reconhecido. E na verdade, o que se vê, é que, tanto aquele que faz muito ou pouco, ambos acabam por ter o mesmo. Sabe, fui docente de 1989 a 1994, e quando entrei, os mais velhos já no quadro,  riam de nós, os novatos, por estarmos a dar o “litro”, enquanto eles relaxavam à sombra do que já tinham conquistado, só pelos anos de serviço. E alertávam-nos que esse “gás” no ia acabar com o tempo.  No início, achei aquelas intervenções estúpidas, mas com o tempo, percebi do que falavam… É que, num sitio onde todos ganham por igual, façam pouco ou muito, leva  os que fazem muito, a fazer cada vez menos… Depois, coloque nas escolas  direcções autónomas, constituídas por pessoal não docente, capaz de gerir com isenção para poder avaliar o trabalho dos docentes sem favoritismos por serem apenas colegas. Uma direcção de pessoas capaz de acompanhar, incentivar, motivar e premiar quem trabalha nas escolas, com uma gestão de recursos responsável e dinâmica. E esqueça as avaliações escritas aos conhecimentos. Isso tira credibilidade às instituições que os formaram. A avaliação ao trabalho é feita através do desempenho diário que se reflecte naturalmente nos resultados.

Depois dê aos alunos condições para estudar. Escolas condignas com equipamentos de qualidade. Não precisa de ter candeeiros assinados por Siza Vieira, nem jardins ao estilo do Palácio de Belém. Apenas não falte com salas amplas e boa luminosidade,  mobiliário ergonómico que permita bom desempenho na aprendizagem. Invista nas bibliotecas escolares para que deixem de ser salinhas com meia centena de livros. E aqui não poupe. Que sejam grandes, amplas e carregadas de estantes com obras das mais variadas, jornais e revistas da actualidade, muitas mesas destinadas á leitura e ao estudo. Até ao 3º ciclo proíba o recurso ao google para trabalhos escolares. Acabe com o copy/paste das crianças e obrigue-as a usar as bibliotecas. A pesquisa feita com recurso aos livros, é muito mais eficaz porque obriga a ler muito, selecionar o que se leu, e depois transcrever. E é neste processo moroso mas eficaz, que a criança aprende. E introduza  no plano curricular destas crianças, 1 hora de visita obrigatória à biblioteca para simplesmente ler. Proíba os TPC. Criança tem de viver. Tem de ter tempo livre. Livre para brincar, estar com os irmãos, família ou simplesmente, descansar. As crianças em Portugal trabalham já mais nas escolas e com carga horária mais pesada que os funcionários públicos. E aquela sua ideia de passar para 50 horas semanais, de permanência da crianca, nas escolas, para aliviar os pais, espero que não tenha passado de uma brincadeira de Carnaval. Não são as escolas que têm de alargar seu período lectivo, são os pais que têm de ter mais tempo para suas famílias, com horários de trabalho menos pesados. Proíba o uso do telemóvel em todas as escolas para que não estejam no facebook enquanto os professores estão a explicar matéria. Os telemóveis estupidificam mais do que ensinam. Trazem perguiça mental e distracção às aulas que bem se dispensa. Acabe de vez com aulas essencialmente teóricas que tornam a aprendizagem maçuda e desinteressante, e programas extensos que obrigam o professor a despejar matéria. E promova o ensino acompanhado da componente prática, que permite um maior desenvolvimento das capacidades do aluno. Diversifique os conteúdos programáticos.  Invista em pavilhões desportivos com qualidade e bem equipados, polivalentes, que possam também integrar outras actividades culturais, de dança,  teatro,  música ou artes. Torne a escola mais divertida não com o alívio de exames, mas com diversidade de disciplinas. Diga não às turmas grandes, sobrelotadas onde o professor passa mais tempo a impor ordem do que ensinar, sem poder acompanhar convenientemente cada aluno.  E no secundário, não se esqueça de criar como obrigatória a disciplina de Introdução à Política. Os nossos futuros eleitores, chegam à idade votante sem saberem o que são eleições legislativas, nem para que servem. Como queremos assim, que o abstencionismo jovem não cresça assustadoramente, se não lhes ensinarmos a importância da particiapação nas decisões políticas. No papel que essas mesmas decisões têm nas suas vidas de futuros profissionais em busca de emprego. Nas escolas, mais do que formar futuros profissionais, formam-se cidadãos.

Aos pais ajude-os a manterem os filhos na escola aliviando seus custos. Acabe de vez com o lobies das livrarias fazendo em todas as escolas um banco de livros, reutilizáveis, para todos os alunos.

E antes de tomar medidas ouça sempre a comunidade envolvida: os professores, os pais, os alunos. Não se apresse. Porque a pressa é inimiga da perfeição e os danos de uma má decisão, nas políticas de educação, prevalecem por décadas. Dê férias prolongadas aos sindicatos, saindo do seu gabinete, e procure ouvir directamente os desabafos , opiniões e sugestões dos professores, e ouça-os. É no terreno que temos a verdadeira percepção do que vai bem ou mal. E os sindicatos, na verdade, estão mais preocupados com a sua própria sobrevivência, abusando das greves,  só para marcar presença. Nunca desfaça uma lei só porque sim. Só porque vem de governos anteriores. O que é bom , deve manter-se independentemente de quem foi o autor.

E não poupe dinheiro na educação. Porque a base de um país próspero e bem sucedido está na formação dos seus cidadãos que, quanto mais bem preparados e qualificados estiverem, mais aptos estarão para conduzir os destinos deste país, criando riqueza e autosustentabilidade que tanto nos faz falta.

Os nossos filhos são o investimento que fazemos no futuro de uma nação e não pode nenhum governo hipotecá-lo.

5 comentários:

  1. Esta carta com algumas poucas correções deveria ser dirigida ao antigo 1º Ministro, fê-lo?

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  2. Comovente esta preocupação agora, debaixo de que pedra viveu nos últimso 5 anos, enquanto as nossas escolas foram esvaziadas de recursos (humanos e outros) e ocupadas constantemente com as diversões saudosistas do Crato?

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  3. 20 valores, mas de nada serve a esta gente que tiraram cursos de teoria e zero em pratica. Para que se fez o 25 de ABRIL 1974 ?

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